Reprodução / © Studio Ghibli

Porco Rosso: O Último Herói Romântico

Studio Ghibli é referência em filmes despretensiosamente cativantes, mesmo aqueles relacionados à guerra

Luiza dos Santos

06/10/2025 às 21:47

A primeira parte do Ghibli Fest trouxe 14 filmes de Hayao Miyazaki para os cinemas brasileiros, tais como Meu Amigo Totoro (1988) e A Viagem de Chihiro (2001). Na última quarta-feira (01), assisti a Porco Rosso: O Último Herói Romântico (1992), que, apesar de não ser um dos filmes mais cotados do estúdio Ghibli, é tão encantador quanto seus irmãos; apesar de não ser perfeito, tem seu charme próprio.

Sinopse

Kurenai no Buta (紅の豚) é um filme japonês de 1992. Em seus 94 minutos (1h34min), navega e voa por aventuras fantasiosas com a direção e o roteiro de Hayao Miyazaki. Seu enredo acontece no Mar Adriático, mar que banha os litorais da Itália, da Eslovênia, da Croácia, da Bósnia e Herzegovina, de Montenegro e da Albânia. É lá que um piloto de hidroaviões, que está sob um feitiço que o transformou em um porco antropomorfizado, atua como caçador de recompensas. Aposentado da Força Aérea Italiana e isolado numa ilha deserta no meio deste mar, Marco ‘Porco’ Rosso caça piratas do ar que roubam os turistas que visitam a região. Tudo isto se passa nos anos 20 (período entre Guerras Mundiais) com um fundo de recessão econômica e de ascensão do fascismo de Benito Mussolini.

Contexto de produção

Originalmente planejado como um curta-metragem de bordo para a Japan Airlines, baseado no mangá Hikōtei Jidait, também de Hayao Miyazaki, Porco Rosso ganhou um tom mais sério após a eclosão da guerra na Iugoslávia, então um Estado que reunia quatro dos seis países banhados pelo Mar Adriático. Todavia, a companhia aérea continuou sendo uma grande investidora e o exibiu em seus voos bem antes de seu lançamento nos cinemas. Fun fact: é por isso que o texto de abertura do filme aparece simultaneamente em japonês, italiano, coreano, inglês, chinês, espanhol, árabe, russo, francês e alemão!

Crítica

O tema do voo é familiar para quem já viu O Castelo no Céu (1986), outro filme do estúdio Ghibli, mas ao contrário dO Castelo, a aviação é o foco principal em O Último Herói Romântico. Os personagens de Rosso são deliciosamente expressivos e a animação do filme é fluida, como esperado de uma produção com o selo do estúdio de Hayao. Similar a muitos outros filmes Ghibli, Rosso não chega a ser uma comédia, mas é muito bem-humorado.

Apesar de sua leveza, Porco Rosso é uma alusão aos absurdos da guerra e do fascismo. Marco, emblematicamente declara: “Melhor ser um porco do que um facista.”, o que, além de irônico, é metalinguístico, considerando que, historicamente, “porco” é um adjetivo atribuído a policiais ou oficiais de Estado, como militares e paramilitares, que contribuem para a manutenção do sistema de opressão. Aqui, Porco não é um “porco” metafórico, mas um porco literal.

Uma hipótese possível para tal seja que este seja o reflexo de como ele se sente internamente por ter participado da Primeira Guerra e ter estado a serviço da Força Aérea Italiana; nós poderíamos mesmo dizer que Marco possui o que se convenciona chamar de culpa do sobrevivente. Outra hipótese, que pode ser considerada separadamente ou em conjunto com a anterior, é que Marco é um porco literal para se diferenciar dos porcos metafóricos, os fascistas, com os quais ele tem problemas desde que largou a Força Aérea.

Porco, apesar de ser um porco, é apresentado como uma figura desejável por suas conterrâneas e turistas. E a esse fato, Porco não se esquiva, sendo romântico porque sim. Como muitos homens de sua época, Marco “Porco” Rosso é convencido de que mulheres seriam intelectualmente inferiores, mesmo que esteticamente admiráveis. No entanto, no decorrer do seu arco de personagem, Porco começa a demonstrar respeito verdadeiro ao feminino, uma mensagem bastante otimista em relação ao papel da mulher, considerando a época em que foi concebido e o tempo histórico que retrata.

Os sons do filme são muito discretos. Como assisti à versão dublada, pode ter sido um erro de mixagem, pois elementos como passos e batidas de porta não faziam barulho em alguns momentos; a trilha sonora também parecia sumir, porque muitas vezes senti falta da música de background.

Esses detalhes sonoros, juntamente com o andamento lento, deixaram o filme um pouco parado. Até cerca de 30 minutos de projeção, o espectador mais rigoroso (ou acostumado a blockbusters hollywoodianos) pode ter dificuldade em entender para onde a história quer levá-lo. Isso acontece porque o longa-metragem dedica bastante tempo a contextualizar seus personagens, a época e o cenário. Para alguns, esse ritmo pode soar como uma fraqueza, mas é indiscutivelmente aquilo que garante a solidez da obra: ser acessível até mesmo para crianças, apesar dos temas severos.

É legal pensar em Porco Rosso e nos outros filmes Ghibli sob a luz da emulação do traço do estúdio por IA, polêmica de meses atrás. Miyazaki havia declarado anos antes: “Eu nunca desejaria incorporar essa tecnologia ao meu trabalho. Sinto fortemente que isso é um insulto à própria vida”.

Essa posição forte por parte do roteirista-diretor sequer abarcou os gastos de recursos, como eletricidade e água, que cada caractere dentro de uma Inteligência Artificial generativa consome, mas focou no insulto ao processo artesanal e meticuloso a que cada filme do Estúdio é submetido antes de ver a luz do dia, o que constitui uma preocupação muito legítima por si só. O trabalho humano dá alma à arte de Hayao e à de qualquer outra pessoa.

Não me arrependo de forma alguma de ter visto Porco Rosso: O Último Herói Romântico; quem ama e se interessa por Ghibli também vai amar assisti-lo.

Nota: 3,5 / 5

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