Reprodução: Ubisoft | Assassin’s Creed: The Ezio Collection

Ubisoft cancelou um Assassin’s Creed por temer impacto do clima político atual

O jogo seria ambientado no pós-Guerra Civil dos EUA com um protagonista negro ex-escravizado

Pedro W. S.

09/10/2025 às 17:08

Um relatório recente, divulgado pelo site Game File, revelou que a Ubisoft cancelou, em 2024, um projeto para um novo Assassin’s Creed ambientado no período da Reconstrução dos Estados Unidos, logo após a Guerra Civil americana. Segundo fontes internas, a decisão teria sido motivada, em parte, por preocupações com o clima político polarizado do país norte-americano.

O jogo, que estava em desenvolvimento inicial no estúdio Ubisoft Quebec, teria um protagonista negro, ex-escravizado do sul dos EUA, recrutado pela Irmandade dos Assassinos para lutar contra a Ku Klux Klan e outras forças que tentavam restaurar o poder branco no país. A narrativa abordaria temas como violência racial, a luta pelos direitos civis e as consequências do assassinato de Abraham Lincoln, com flashbacks mostrando momentos da própria Guerra Civil.

Segundo o Game File, a decisão de interromper o projeto foi tomada em julho de 2024, pouco depois da tentativa de assassinato de Donald Trump na Pensilvânia, um evento que, embora não tenha sido o gatilho direto, evidenciou a instabilidade social e política atual dos EUA. A Ubisoft teria considerado o jogo “demasiado político em um país demasiado instável”.

O cenário norte-americano atual é marcado por tensões raciais renovadas, disputas culturais em torno da história e uma crescente resistência a discussões sobre escravidão e racismo estrutural, especialmente em estados do sul, onde leis estaduais têm restringido o ensino de temas ligados a injustiças históricas. Nesse sentido, um jogo com um protagonista negro enfrentando a Klan no século XIX, apesar de uma narrativa histórica que aborda temas sobre racismo e supremacia branca extremamente factuais e relevantes, serviria também como um comentário direto sobre o presente, algo que a liderança (e muitos eleitores) norte-americana não deixaria passar ileso.

Outro fator que influenciou a decisão foi a reação dividida ao Assassin’s Creed: Shadows, lançado no ano passado, que trouxe Yasuke, historicamente um samurai negro, como um dos protagonistas. A Ubisoft enfrentou ataques racistas nas redes sociais e campanhas coordenadas de boicote, o que teria reforçado a percepção interna de que lançar um título sobre o pós-Guerra Civil seria “arriscar a reputação da franquia” em um momento de extrema polarização.

Yasuke de Assassin’s Creed Shadows. Divulgação | Ubisoft

Desde então, movimentos racistas nos EUA têm crescido, conforme a presidência atual toma medidas cada vez mais extremas para marginalizar ainda mais certas camadas da população, como negros, imigrantes, pessoas LGBTQIA+ e outros grupos. A polêmica envolvendo Yasuke, embora preocupante, permaneceu relativamente contida em ambientes online como Twitter/X e não repercutiu amplamente fora das redes sociais. É bem provável que esse suposto novo jogo, que aborda de forma muito mais direta questões de racismo estrutural, pudesse gerar uma polêmica sem precedentes para a Ubisoft.

É preocupante então que foi perdida a oportunidade de abordar um período essencial da história americana no quesito da construção sociológica de raça e racismo. Independente da Ubisoft não ser necessariamente uma das empresas mais populares quanto à qualidade dos seus últimos jogos, a inviabilidade de ser desenvolvido e publicado um jogo que trata de narrativas sobre liberdade, poder e identidade racial mostra perfeitamente os tempos perigosos em que vivemos. O medo da censura e ataques reacionários ilustra como o clima político contemporâneo dos EUA, com seu medo de debates sobre racismo e memória histórica, pode moldar e limitar a arte e o entretenimento que ousam lidar com o passado de forma crítica.

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